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Como os índios banidos fisicamente podem penetrar na sociedade de forma incorpórea?

Mucuiú, motumbá, kolofé, sarava, axé,

Realizamos no último sábado, dia 8 de junho, uma Festa de Caboclo no Ilé Oka Sete Estradas, em Itanhaém. No entanto, o que significa essa palavra “caboclo” que amiúde citamos em nossas prédicas, textos etc.?

Aproveito, para esta discussão, ideias que já levei a público em meu livro O mito de origem:  uma revisão do ethos umbandista no discurso histórico (Arché Editora, 2013, no Apêndice das páginas 139-140 e cujo título é o mesmo que encabeça esta postagem). Ali disse que: “A questão da representação social da figura do caboclo deve ser discutida em dois aspectos: primeiro, o da formação do conceito caboclo pelas classes dominantes; segundo, como reinterpretação do ‘produto cultural’, dando-lhe um aspecto original e renovado dentro das questões espirituais.” Esse conceito deriva sobretudo da etimologia, isto é, da origem da própria palavra: “O termo caboclo surgiu de maneira pejorativa, era como uma ofensa, algo chistoso. Isto tomou uma proporção tal na sociedade do século XVIII, que foi proibido por lei o uso desta palavra, pois ela tinha como finalidade agredir.”

Tal proibição constou de medidas do então Marquês de Pombal e caboclo era o mestiço de indígena com o branco indo-europeu ou o africano: resultado direto da interação entre duas matrizes, indo-europeia e indígena. No entanto, “Chegamos então a ter na palavra caboclo algo infame e, inclusive, proibitivo. Significa etimologicamente aquele que mora na mata, a parte da sociedade tida como ‘incivilizada’, de acordo com os moldes ocidentais. Não podemos nos esquecer de que se tratava apenas de uma questão de interpretação cultural, a não aceitação de outro valor, marcando ainda mais a chancela do etnocentrismo e do ‘cristianocentrismo’.”

Isso porque o caboclo sofria do mesmo preconceito que sofriam seus ancestrais. Desse modo, não foi à toa que nas religiões afro-brasileiras se tornou o que muitos chamaram de “Orixá brasileiro”. Oriundo do candomblé de caboclo, fez-presente em muitas escolas das religiões afro-brasileiras “como um resgate e uma homenagem à cultura mestiça, à inclusão de cultura e à apreensão da reinterpretação vívida de valores. O mestiço e caboclo transformaram-se de modo a abalar todas as certezas e enveredar para aspectos mais universalistas, pois não pertenciam ao europeu, ao africano ou ao americano, embora tivessem elementos de todos eles: era uma ‘síntese’. Caboclo era o símbolo renovado do novo homem, capaz de transformar, recriar sem medo de conflitar com antigas tradições.”

São entidades que atuam nas religiões afro-brasileiras com a capacidade de penetrar  visões de mundo diversas, por meio de uma identidade múltipla, alcançando a coletividade para combater as agruras do mundo com seus diferentes meios.

A todos os caboclos, e também às caboclas, quer sejam de pena, quer sejam boiadeiros, prestamos nossa homenagem e agradecimento por nos mostrar como a alegria contagiante da Festa, alegria com responsabilidade, pode ser um remédio eficaz para combater a dor do mundo.


 Mãe Maria Elise Rivas

 Íyá Bê Ty Ogodô

 Mestra Yamaracyê



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